Dançando ele me beijou, jurei, mesmo sem ele pedir, não contar pra ninguém, foi de repente, inesperado, estremecedor e proibido parecia que era, até hoje eu não sei. Dormi pensando que tinha mudado tudo, que a partir daquele momento tudo seria diferente, pensando que levaria só comigo pra sempre aquele segredo e ponto.O que ele pensava, não sei. Sei que não me deixou, não me deixou esquecer, não me deixou esconder, não me deixou ir sozinha, sei porque tentei muito ir, e ele não deixava de jeito nenhum, mudei tudo, fiz uma reviravolta, enfrentei olhares furiosos, decepcionantes, inquisitivos. Tive medo de pular e então ele ficava me puxando, até que mergulhei, mergulhei fundo, tão fundo que eu quase não lembro, de ter dezessete anos, de descobrir o sexo, o amor, a dor, de as vezes não saber o que tava fazendo, de não saber o motivo e de pensar que não tinha como ser mais feliz.
Três anos, uma sms estranha, o fim que não foi, as revelações mordazes, minha prima, a secretária dele e não sei mais quem. Por que. Porque então ele não me deixava ir, eu pedia, eu implorava, e ele implorava pra eu ficar. No último dia eu sabia dizer bem o que eu sentia, uma faca, dilacerando meu coração, não era só entrando, entrava e remexia lá dentro, cutucava, tirava, entrava, saía e voltava de novo, não párava, doía. Ele ligou durante cento e oitenta dias seguidos, todos os dia. Eu não atendia e doía. Eu dormia, acordava e doía. Eu fazia de conta que tava seguindo com a vida e doía.
Mudei de cidade, faz tempo. A ferida fechou, mas a cicatriz não me deixa mentir, nem esquecer.
Bruna Maia Amorim