quinta-feira, 5 de junho de 2008




















A lembrança dela me veio por acaso, em meio a tanta leitura de febres, doenças que havia feito minutos atrás, ela simplesmente voltou. Estava escondida, guardada no canto dedicado as coisas tristes da vida que sempre ensinam muito. Não lembro direito quantos anos tinha na época, mas eu era novinha, dos oito pros nove, ou algo muito perto disso. Lembro como se fosse ontem o caminho feito até a casa dela, nunca tinha visto tudo aquilo, tanta falta de verde e no fim de uma rua de barro, lá estava uma casinha.
Dentro uma pequena cozinha e em cima do armário uma bolachinha recheada, perdoem as intenções que tive, mas criança gosta mesmo é de doce. E depois segui para um quarto, estava lá deitada na cama, com os cobertores a cobrindo até o pescoço, o rosto lívido, cansado, olhar apagado, mas ela sorriu. Logo trataram de conversar sobre inúmeras coisas das quais não prestei atenção, sentei do lado daquele corpo frágil e embalada pelo som das vozes eu adormeci entre os cobertores que agora abrigavam dois corpos.
Naquela idade quando bolachinhas importavam eu pouco liguei para a doença que aquela mulher carregava, depois alguns anos mais tarde me encontrei nesta dúvida e perguntei a minha mãe. AIDS.
Posso ainda ouvir sobre as histórias das quais ela viajou o mundo inteiro, conheceu lugares com os quais sonho desde pequena e tive tanto medo de viajar e acabar morrendo como ela. Era AIDS, era vítima de uma doença que na época era preenchida com muito mais preconceito e segredo.
Na segunda vez que a vi queria tanto dar alguma coisa para que lembrasse de mim e acabei por não dar nada, agora aqui há uma espécie de dedicatória à aquela alma que muito preencheu minhas curiosidades, idéias e histórias.

Camila Meneghetti

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